sábado, 15 de janeiro de 2022

Brilhante e Prateado

 Palavras: burro, prisioneiro, miséria, combate e delicado

     Ali para os lados de Trás-os-Montes, mas não numa vila, numa das aldeias por ali, vivia um burro. Desde sempre, desde que se conhecia como burro, a sua função era ajudar o dono nas tarefas agrícolas. De sol a sol, a chover… ou a nevar… não havia descanso! Mesmo sem nunca ter sido amarrado com corda ou corrente, sentia-se prisioneiro naquela vida de miséria…. E agora, velho e sem forças, ainda tinha que aguentar o mau humor do dono que passava o tempo a esbravejar:

     - Besta velha e cansada! Já nem com a albarda pode! Raios parta a besta excomungada! – repetia o homem vezes sem fim.

     Foram anos de fiel serventia àquele patrão, por isso o nosso amigo burro achou que não merecia tamanha ingratidão. Passou dias e dias a matutar no assunto, até que tomou uma decisão:

      - Se já não sirvo para mais nada aqui, vou-me embora em busca de um novo dono.

      O pobre animal esperou a calada da noite e saiu porteira fora, em busca de melhor destino. Marchou quilómetros sem parar, com receio que o antigo dono viesse à sua procura. Passou rios, vales e montanhas… sentia-se exausto e o desânimo tomou conta de si:

       - Será que fiz a escolha certa? Agora nem dono, nem casa, nem sei para onde ir. – lamentava-se o pobre animal.

       Ainda pensou em retornar à antiga vida, mas foi só lembrar os maus-tratos pelos quais havia passado que decidiu seguir em frente. O tempo ia passando e nada mudava. O burro continuava triste, sozinho e a sentir-se inútil. Resolveu parar em baixo de uma frondosa árvore à beira de um ribeiro. Já nem dava pelas horas quando sentiu um barulho ao pé de si. Despertou muito assustado e ficou ainda mais espantado com o que acabara de ver… Um burro com óculos!

        - Que susto! Pensei que estavas morto! – disse o burro de óculos.

        - Eu? Morto? Logo agora que comecei a gozar a minha reforma? Nem pensar! – retrucou o outro.

        - Bem antes de mais, vamos às apresentações – continuou o burro de óculos. Eu chamo-me Brilhante. Deram-me este nome não por causa da cor do meu pelo, mas porque, eu, de burro, não tenho nada! Eu gosto de ler e dar lições às gentes que encontro. E tu, como te chamas?

       - Não sei. O meu antigo dono passou a vida a chamar-me de “besta”. Talvez este seja o meu nome….

       - Que nada! Besta é sinónimo de burro. Então, se não tens nome, podemos arranjar-te um depressa. Que tal: Cometa? Ou Júpiter? Ou Manso?

       - Não me agradam muito….

       - Já sei… Eu sou o Brilhante… e tu serás o Prateado! Deste, já gostas?

      - Sim, ótima ideia! Adorei!

      - O que fazes aqui, amigo Prateado? – perguntou o Brilhante.

          - Ando há dias, sem parar, a fugir do meu antigo dono. Fartei-me da vida que tinha: anos de sofrimento, muito trabalho e, agora, que estou velho ainda pior. – lamentou-se.

         - Que horror! Nem quero imaginar o que é viver assim. Quando era pequenino fui oferecido a um rapazinho que gostava muito de livros. Com ele, aprendi a ler e hoje conto histórias e piadas para as crianças no circo. – orgulhou-se o Brilhante.

          - Sorte a tua! Ainda hoje tem serventia e faz algo que gosta…. Já eu… pobre de mim… a minha vida acabou. Nem para onde ir tenho! – resmungou o Prateado.

          - Meu caro novo amigo, se lesses como eu, ia aprender muitas lições de vida… A vida é um eterno combate. Já dizia o grande filósofo alemão Johann Goethe: “Apenas é digno da vida aquele que, todos os dias, parte para ela em combate!” Então, vamos a isso, companheiro ! Não fujas à luta! – encorajou o Brilhante.

          - As tuas palavras são muito bonitas, mas de nada me adiantam… não vão resolver o meu problema.

           O burro Brilhante percebeu que o amigo Prateado estava a passar por um momento muito delicado… e foi aí que, mais uma vez, fez justiça a seu nome: teve uma brilhante ideia…

           - E se viesses comigo para o circo?

           - Eu? No circo? O que iria fazer lá? Ainda se soubesse ler como tu… - disse o Prateado.

           - Nada disso! Ainda me roubarias o lugar… - riu-se o Brilhante. Tu poderias servir de montaria para as crianças. No intervalo dos espetáculos, ia saber-lhes bem dar uma voltinha de burro.

            - Achas que vão aceitar-me lá? – duvidou o Prateado.

            - Nem duvides disso! Ou não me chamo Brilhante!

            E lá foram os dois burros rumo àquele que seria o novo lar do Prateado. Ele foi logo aceite pela família circense e, naquela mesma noite, estreou-se no mundo dos espetáculos… Depois da apresentação de mágicos, trapezistas, contorcionistas e palhaços, entrou no picadeiro o burro Brilhante.

           A pequenada adorava o Brilhante… e, a partir daquele dia, também passou a fazer a alegria do Prateado. Ele levava-as a passear pelo circo, parava para tirar fotos com elas… Nunca tinha sido tão feliz! Quando achava que tudo havia perdido, a sua vida ganhara um novo sentido. Tudo graças ao seu amigo Brilhante… Os dois formaram uma dupla inseparável e imparável. Iam de aldeia em aldeia a divertir miúdos e graúdos. E agora, podeis estar a perguntar: Burro que falam? Que pensam? Que usam óculos? Que sabem ler?... Bem, se isso foi verdade ou não, não sei…só sei que foi assim…

 

Diego Dinis, 7º D, Débora Dinis

 

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